quinta-feira, 21 de julho de 2016

[RESENHA] "MEU INVERNO EM ZEROLÂNDIA", DE PAOLA PREDICATORI

Nome: Meu Inverno em Zerolândia
Autora: Paola Predicatori
Editora: Suma de Letras
Onde comprar: Buscapé
Romance de estreia da italiana Paola Predicatori, Meu inverno em Zerolândia é a história de uma perda, da vida escolar conturbada e dos caminhos desajeitados e incertos que o amor pode tomar.

Alessandra tem 17 anos quando sua mãe morre. Sua dor é como uma redoma e quando retorna à escola, se afasta dos amigos e vai sentar junto a Gabriel, conhecido como Zero, a nulidade da turma. Deseja apenas ser ignorada, como acontece com ele. Zero, porém, é mais interessante do que parece. Em sua falsa indiferença, é atento e sensível. É ele quem socorre Alessandra, aparecendo inesperadamente ao seu lado quando ela precisa de ajuda. Viram um par: Zero e Zeta.

Aos poucos, um sentimento indefinível ganha forma entre as paredes da classe e a praia de inverno, surgindo uma história delicada e forte que mudará para sempre a vida desse casal de adolescentes. De maneira realista, Meu inverno em Zerolândia mostra a juventude italiana e seu cotidiano, em uma história dura e envolvente, capaz de mostrar que a soma de dois zeros não é zero, mas sim dois. 


Em "Meu Inverno em Zerolândia" conhecemos Alessandra, uma adolescente que está vivendo um momento que ela poderia muito bem chamar de pesadelo. A garota perdeu a mãe para o câncer e agora tem que lidar com a dor e tentar seguir em frente, isso enquanto enfrenta o último ano do ensino médio e as assustadoras perspectivas do futuro.

Conhecer a verdadeira angústia e sofrimento mudou muito Alessandra, que passou a ter uma nova visão da vida. Tudo agora parece diferente e coisas tão banais, como a sua reputação na escola, deixaram de ter importância. Sem poder contar com o pai - que ela nunca conheceu - e com a avó mergulhada na própria dor, Alessandra sente-se sozinha em um mundo que desaba ao seu redor. Ela já não tem paciência para as conversas e atitudes bobas de suas amigas.
“Sofrer é também um modo de amar você, e eu agora sei quanto te amei, e só o sei quando me sinto assim. Talvez seja uma estupidez pensar desse jeito, mas às vezes acho que com a felicidade não se aprende nada.”
Assim, na volta às aulas após o período de luto, Alessandra surpreende a todos ao sentar-se na 'zona vermelha' da classe, ao lado de Gabriel Righi, o aluno quieto que ganhou dos outros o apelido de Zero – o que faz com que, mais tarde, Alessandra comece a ser chamada de Zeta. Logo as piadinhas e especulações sobre ambos se espalham pela sala de aula, não que eles deem importância para isso. Alessandra e Gabriel não se falam - pelo menos inicialmente; eles se isolam cada um no seu espaço e mantém o silencioso constante em seu ‘reino’ compartilhado, Zerolândia.

Mas Gabriel não é simplesmente um perdedor, um estudante desinteressado, com problemas familiares e possivelmente envolvido com drogas como todos pensam. Há muito mais sobre ele do que qualquer um pode imaginar e a protagonista vai aos poucos descobrindo isso.
“Viro a folha, mas no verso não há nada escrito, nem sequer um endereço ou um número de telefone. Nada. Mas você assinou: Zero, está escrito, e não Gabriel, não quem você é, mas aquele que todos sempre acharam que você fosse.”
Alessandra tenta encontrar seu lugar no mundo outra vez, questionando como todos podem apenas seguir em frente enquanto sua vida está caindo aos pedaços. Gabriel parece viver em seu próprio universo, ignorando todos os colegas insignificantes ao seu redor.

Ambos têm seus próprios fantasmas para enfrentar e acabam de alguma forma encontrando conforto na companhia e nos braços um do outro. Dois jovens opostos que se unem no que parecia ser uma improvável amizade, dando início a um relacionamento extremamente frágil e confuso.

Eu não consegui identificar quem Alessandra foi antes da doença de sua mãe – se era do tipo popular malvada, apenas um pouco mimada ou simplesmente sem noção –, mas a garota que acompanhei durante toda a narrativa era uma boa pessoa e estava completamente perdida, suportando sozinha muita coisa que uma adolescente não deveria.
“Em certos momentos me dou conta de que você está morta e aceito tudo: a casa que não reconheço mais, as coisas que lentamente escorregam para uma distância de objetos esquecidos. Agora percebo que em cada coisa se repete a sua morte, até em mim: sua morte é a minha morte. [...]
Morre-se também assim, acho: não se usam mais certos objetos, não se entra mais em certos aposentos. Aprisionamos o passado para que ele não nos alcance mais com o peso das lembranças.”
Ao longo das páginas, em sua tentativa de retomar o controle da própria vida, vemos Alessandra fazer muitas decisões, mas nem todas são inteligentes - especialmente quando, de alguma forma, envolviam Gabriel. Algumas atitudes foram tomadas pelo próprio bem-estar, mas diversas vezes ela fazia algo apenas para chamar a atenção ou mostrar ao Gabriel que não dava importância para ele, e é aí que na maioria das vezes dava merd@. Pois é, não foram poucos os momentos em que eu quis entrar no livro para dar um abraço de consolo ou uma sacudida na personagem.

E com Gabriel meus sentimentos não foram tão divergentes. Eu amei o jeito "fod@-se o mundo" dele, ignorando os colegas da sala de aula que o destratavam por ser quem ele é, mas sua indiferença vai longe demais. O garoto faz uma coisa ou outra em seu relacionamento com Alessandra, mas na maioria das vezes a iniciativa de qualquer coisa é deixada para ela e o pior é que Gabriel ainda faz parecer que ele não está nem aí se ela decidir se afastar de vez.
“É essa a sensação que Gabriel dá: ele é alguém que não precisa de nada. Inclusive quando estávamos na pizzaria, tive a mesma sensação: se eu não estivesse ali, não faria diferença.”
O que eu esperava de “Meu Inverno em Zerolândia” era uma linda história de amor entre dois adolescentes no melhor estilo ‘flores e corações’, mas o que encontrei foi algo bem diferente e nem um pouco ruim.

O livro vai além do romance, focando nos problemas de Alessandra e suas tentativas de recomeçar a vida. A narrativa é intensa e emocionante, capaz de fazer o leitor entrar na pele da personagem, fazendo-o sentir todas as dores e os conflitos da mesma. 

Durante a maior parte da história acompanhamos Alessandra no presente conforme ela vive um dia de cada vez enquanto tenta combater sua tristeza, mas também somos levados ao passado, o que nos possibilita conhecer um pouco a mãe dela e presenciar a conexão entre as duas, além da luta de toda a família contra o câncer.
“Naquele dia com você, encontrei o pote de ouro escondido nos seus olhos, que não paravam de rir enquanto você dirigia e comentava tudo, porque tudo merecia ser olhado [...]
Eu me sentia feliz e por um instante imaginei que o milagre ainda podia acontecer: você finalmente curada, eu com o seu amor.
Aquela lembrança é o feitiço mais poderoso que eu conheço: você se torna terra e meu coração, vidro.”
A relação de Alessandra e Gabriel é estranha, sem muitos diálogos. Eles não conversam sobre o que há entre eles, mas em certos momentos fica claro que existe expectativa de um em relação ao outro. Essa falta de comunicação acaba trazendo complicações para o relacionamento e só piora com a situação em que eles vivem, com ela agindo de modo mecânico, enquanto ele o tempo todo veste a máscara da indiferença.

“Meu Inverno em Zerolândia” foi uma surpresa agradável, que arrancou de mim muitas e muitas lágrimas (o que não é surpreendente, porque é muito fácil me fazer chorar). A autora tem uma escrita leve e fluída, que consegue mexer com os sentimentos do leitor. A narrativa é em primeira pessoa, como se Alessandra estivesse escrevendo para a mãe e para Gabriel, e por isso ela tem um tom melancólico que provoca reações no leitor. Para mim foi difícil conseguir terminar esta resenha e ainda não acho que consegui as palavras certas para expressar o quanto amei este livro.
“A ausência se torna presença, o vazio se torna suportável, o tempo faz o resto.
Em que se transformam as pessoas que não existem mais: aquilo que existiu ou tudo aquilo que desapareceu?”

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